Platão - Górgias
um diálogo (ainda) contemporâneo
 


 
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É da tradição designar os diálogos platónicos com subtítulos. Na obra em apreço o excesso não desvirtua o conteúdo: Górgias ou Acerca da Retórica, ou ainda Acerca das Virtudes Políticas, ou até, como preconiza Bernard Suzanne, nas suas Tetralogias, Ilusão de Justiça.

Longe das certezas que não nos permitem exorcizar a dúvida, diremos que este é um diálogo de transição, inserido no período socrático, vocacionado, a par das obras de juventude, para a investigação da virtude, culminando, tal como estas, numa aporia. Reclamando-nos da prudência aconselhada pela complexidade da controversa ordenação da Obra platónica, cujos estudos contemporâneos ainda não deram frutos definitivos, podemos contudo referir que o diálogo Górgias, terá sido escrito antes da primeira viagem a Siracusa, lugar de um rei, mas onde era preciso enxertar um filósofo. O Górgias é considerado o mais brilhante dos diálogos platónicos.

Platão é o criador de um género literário que designamos por diálogo socrático e, na linha da tradição grega, impressa na tragédia e na comédia, suportes de uma procura ímpar do sentido da vida, o Górgias mantém traços evidentes de uma analogia narrativa e dramática deixando-nos, por diversas vezes, a sensação de nos confrontarmos com um palco, onde o texto acontece, tal é a vivacidade dialéctica subjacente à vertiginosa construção argumentativa. O problema e a palavra que o diz não é um assunto exclusivo dos interlocutores, passa rapidamente para o leitor e aí, também nos descobrimos, envolvidos e empenhados na tarefa que é o espectáculo da vida - que para Platão são duas e a melhor nem é a que agora vivemos...

O Górgias é um diálogo para políticos, para candidatos e para os que sofrem a sua acção. A sua leitura talvez deixe uns e outros pelo caminho... Aos que seguirem o texto, a sociedade agradece.

Numa caracterização mais específica, o Górgias insere-se dentro do género dos diálogos platónicos de investigação ou zetéticos, de combate ou agonístico, refutativo ou anatréptico.

 

J. Costa, Viseu, Out. 1998
Arranjo gráfico de A.R.Gomes
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O Canto
da Filosofia