PROVA 114
EXAME NACIONAL DO ENSINO SECUNDÁRIO
12.° Ano de Escolaridade (Decreto-Lei n.° 286/89, de 29 de Agosto)
Cursos Gerais - Agrupamentos 3 e 4
Duração da prova: 120 minutos
1.ª FASE
2003
1.ª CHAMADA
PROVA ESCRITA DE FILOSOFIA
[critérios de classificação do Ministério]

 

Leia atentamente as instruções:

  • Esta prova é constituída por 2 (dois) grupos de questões:
    - GRUPO I - 3 (três) questões;
    - GRUPO II - 1 (uma) questão.
  • A indicação do número de linhas/palavras tem um carácter meramente orientador do grau de desenvolvimento da resposta.
  • A inadequação das suas respostas às questões formuladas implicará uma pontuação de O (zero) pontos.

Grupo I

Grupo II

Cotações


GRUPO I

    • Seleccione apenas um dos textos transcritos e responda às três questões que lhe são colocadas acerca desse texto e da obra a que pertence.
    • Na resposta às questões 1 e 2 deverá utilizar, em cada uma, aproximadamente 10 linhas (cerca de 80 palavras).
    • Na resposta à questão 3 deverá utilizar, aproximadamente, 40 linhas (cerca de 320 palavras).
    • A mera transcrição de frases do texto implicará uma pontuação de O (zero) pontos.
    • A não manifestação do conhecimento da obra implicará uma pontuação de O (zero) pontos.

 

 

DA NATUREZA, Parménides

TEXTO

    Como poderia perecer o que é? Como poderia gerar-se?
    Pois, se se gerasse, é porque não é, nem tão-pouco se vier a ser.
    Assim a geração se extingue e a destruição é coisa em que se não fala.
    Também não é divisível, pois que é homogéneo.
    Nem há mais num ponto, que o impeça de ter coesão,
    nem menos no outro, mas tudo está cheio do que é.
    Assim é tudo contínuo; pois o que é está cerca do que é.
    Além disso, está imobilizado nos limites de cadeias potentes,
    sem começo, sem interrupção; pois geração e destruição
    foram lançadas para longe, e a convicção verdadeira as repeliu.
    É o mesmo, que permanece no mesmo e em si repousa,
    ficando assim firme no seu lugar.

    Frag. 8, v.v. 19-30, in M. Helena da Rocha Pereira,
    Hélade
    , Coimbra, FLUC, 1990, p. 131

 

QUESTÕES

    1. Explicite a justificação da tese da continuidade do ser.
    2. Explique, com base no texto, a imagem do ser «imobilizado nos limites de cadeias potentes».
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

     


     

GÓRGIAS, Platão

TEXTO

    Querefonte - Pois bem, diz-me então qual é a arte exercida por Górgias e qual o nome que, consequentemente, lhe devemos atribuir.
    Polo - Querefonte, muitas são as artes cultivadas pelos homens, que as descobriram experimentalmente através de experiências. Na realidade, é a experiência que orienta a vida do homem segundo as regras da arte, ao passo que a inexperiência a faz caminhar ao acaso. Perante estas variadas artes, uns declaram-se por umas, outros por outras, e os melhores escolhem as melhores. Górgias pertence ao número destes últimos, e a arte que cultiva é a mais bela de todas.
    Sócrates - Tenho a impressão, Górgias, de que Polo está muito bem equipado em matéria de discursos, mas não me parece que esteja a cumprir a promessa que fez a Querefonte.
    Górgias - Explica-te melhor, Sócrates.
    Sócrates - Acho que ele ainda não respondeu ao que se lhe perguntou.
    Górgias - Pergunta-lhe então tu, se preferes.
    Sócrates - Não, gostaria muito mais de te interrogar a ti, no caso, evidentemente, de estares disposto a responder-me. Do que acabo de ouvir a Polo deduzo que ele se tem dedicado mais à chamada retórica do que à dialéctica.
    Polo - Porquê, Sócrates?
    Sócrates - Porque Querefonte te perguntou qual era a arte cultivada por Górgias, e tu, em vez de dizeres qual é, limitaste-te a elogiá-la, como se alguém a estivesse a atacar.
    Polo - Não respondi eu que era a mais bela das artes?
    Sócrates - Respondeste, mas ninguém te perguntou quais eram as qualidades da arte de Górgias: perguntaram-te apenas que arte era e qual o nome que convém atribuir a Górgias. Relativamente aos exemplos que há pouco te apresentou Querefonte, respondeste com justeza e concisão. Diz agora da mesma maneira qual é a arte de Górgias e como devemos designá-lo. Ou antes, Górgias, diz-nos tu próprio como devemos chamar-te em função da arte que exerces.
    Górgias - A minha arte é a retórica, Sócrates.
    Sócrates - Devemos então chamar-te orador?
    Górgias - E bom orador, Sócrates, se me queres chamar aquilo que «me glorifico de ser», como diz Homero.
    Sócrates - Sem dúvida que quero.
    Górgias - Chama-me então assim.
    Sócrates - E poderemos dizer que és capaz de formar outros oradores?
    Górgias - Essa é a profissão que exerço, não apenas aqui, mas em toda a parte.

    448c-449b, Lisboa, Edições 70, 1991, pp. 21-24

     

    QUESTÕES

    1. Explique, com base no texto, o que leva Sócrates a considerar que Polo se dedica mais à retórica do que à dialéctica.
    2. Explicite, a partir do texto, o que quer Sócrates saber acerca de Górgias e da sua arte.
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

FÉDON, Platão

TEXTO

    [Símias] -(...) o argumento que invocas, qualquer um podia aplicá-lo à harmonia e a uma lira com as respectivas cordas. Também da harmonia se poderá dizer que é o elemento invisível, incorpóreo, algo de sumamente belo e divino, que jaz na lira harmonizada; e da lira em si, bem como das cordas, que é o elemento material, corpóreo, compósito e terreno, aparentado ao que é de natureza mortal. (...) E, portanto, se a alma é na realidade uma espécie de harmonia, temos então que, quando o nosso corpo se distende ou se retesa em excesso, por efeito de doenças ou de quaisquer outros males, a alma não tarda, apesar de sumamente divina, a ficar aniquilada, tal como essas outras harmonias, que encontramos nos sons e nas demais obras dos artífices; e enquanto isto, os despojos de cada corpo permanecem ainda longo tempo, até serem consumidos pelo fogo ou apodrecerem. Vê, pois, o que responderemos a um argumento destes, se alguém sustentar que a alma, sendo uma combinação de elementos do corpo, é a primeira a ficar aniquilada nisso a que chamamos morte... (...)
    [Sócrates] - Vejamos então um desses defensores da teoria da alma-harmonia: segundo ele, que representarão na alma estas duas coisas — virtude e vício? Dirá, no primeiro caso, que é ainda outra espécie de harmonia e, no segundo, uma desarmonia? E que uma alma harmonizada, ou seja, uma alma boa, sendo já de si uma harmonia, possui em si mesma uma outra espécie de harmonia, enquanto a que é desprovida de harmonia, embora sendo ela também uma harmonia, não possui essa segunda espécie?
    [Símias] - Por mim, nada posso garantir. (...) Mas é claro que um defensor de tal teoria não deixaria de te dar mais ou menos uma resposta dessas. (...)
    [Sócrates] - Vejamos ainda: em tais condições, será admissível que qualquer alma, comparada com outra, tenha maior porção de virtude do que de vício, se é certo ser a virtude uma harmonia e o vício uma desarmonia?
    [Símias] - Inteiramente inadmissível.
    [Sócrates] - Mais até, Símias: seguindo à risca a tua argumentação, jamais uma alma, como harmonia que é, terá parte no vício; pois nenhuma harmonia, que seja plenamente harmonia e tão-só isso, poderá alguma vez ter parte da desarmonia.

    85e-94a, Coimbra, Livraria Minerva, 1988, pp. 86-98

     

    QUESTÕES

    1. Explicite a objecção de Símias à imortalidade da alma.
    2. Explique, com base no texto, a resposta de Sócrates à objecção exposta por Símias.
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

CATEGORIAS, Aristóteles

TEXTO

    Substância, na acepção mais fundamental, primeira e principal do termo, diz-se daquilo que nunca se predica de um sujeito, nem em um sujeito, por exemplo, este homem ou este cavalo. No entanto podemos falar de substâncias segundas, espécies em que se incluem as substâncias primeiras, e nas quais, se são géneros, ficam contidas as mesmas espécies. Por exemplo: o homem individual inclui-se na espécie nominada homem e, por sua vez, incluímos essa espécie no género chamado animal. Designamos, portanto, de segundas estas últimas substâncias, isto é, o homem e o animal, ou seja, a espécie e o género.

    Do exposto deduz-se com evidência que o predicado deve ser afirmado já do sujeito, já do nome, já da definição, por exemplo, homem é predicado de um sujeito, ou seja, o homem individual; por um lado, o nome da espécie chamada homem predica-se afirmativamente de cada indivíduo; por outro, aplicamos a palavra homem a um homem, porque o homem individual é ao mesmo tempo homem e animal. De modo que, por conseguinte, o nome e a noção de espécie são ambos categoria do sujeito. Quanto ao que está presente ou se acha em um sujeito, os seus nomes e definições não são predicáveis do sujeito, pelo menos na maior parte dos casos. Noutros, contudo, nada impedirá que o nome seja predicado do sujeito, mas já o mesmo não se verifica para a definição, por exemplo: o nome branco é sem dúvida inerente a um sujeito, um corpo, porque o corpo é o que chamamos branco. Todavia, a definição de brancura jamais pode ser predicada de qualquer corpo.

    Quanto ao mais, ou bem que se diz das substâncias primeiras, ou bem que se acha nelas como em seu sujeito. Tanto resulta manifesto nos exemplos particulares que se nos apresentam. Tomemos por exemplo o termo animal, que se predica de homem. Animal é predicado de um homem determinado, porque, se o não fosse de nenhum homem determinado, não o seria também de homem em geral. Outro exemplo: a cor está no corpo, de modo que também está neste ou naquele corpo, pois se pudesse estar onde não estivesse qualquer corpo, a cor não estaria absolutamente no corpo em geral. De modo que todas as coisas, sejam elas quais forem, excepção feita às substâncias primeiras, ou são predicados das substâncias primeiras, ou então acham-se nelas na acepção de sujeitos. E não havendo estas substâncias primeiras, não haveria nenhuma das outras substâncias.

    2a-b, in Organon, Lisboa, Guimarães, 1985, pp. 48-50


    QUESTÕES

    1. Esclareça o conteúdo do primeiro período do texto.
    2. Partindo do texto, esclareça o primado das substâncias primeiras.
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

O MESTRE, Santo Agostinho

TEXTO

    AGOSTINHO - Que te parece que queremos levar a efeito quando falamos?
    ADEODATO - Quanto precisamente me ocorre agora, ou ensinar ou aprender.
    AGOSTINHO - Vejo e concordo com uma das partes, pois é evidente que quando falamos queremos ensinar. Mas aprender, como?
    ADEODATO - Como te parece enfim que é, senão interrogando?
    AGOSTINHO - Pois eu entendo que, mesmo neste caso, não pretendemos outra coisa que não seja ensinar. Com efeito, pergunto-te se interrogas por outro motivo senão o de dar a conhecer o que queres àquele que interrogas?
    ADEODATO - Dizes a verdade.
    AGOSTINHO - Já vês então que nada mais pretendemos com a locução, além de ensinar.
    ADEODATO - Não o vejo com toda a clareza, porque, se falar não é mais que proferir palavras, parece-me que o mesmo fazemos quando cantamos. Ora, como isto o fazemos muitas vezes sozinhos, não havendo ninguém presente para aprender, não penso que queiramos ensinar qualquer coisa.
    AGOSTINHO - Eu, porém, julgo que há um género de ensinar por meio da rememoração, e certamente importante; isto no-lo indicará o assunto mesmo da nossa conversa. Mas, se és de parecer que não aprendemos quando recordamos e que não ensina aquele que rememora, não te contrario. Entretanto, estabeleço desde já dois motivos por que falamos: ou ensinar ou rememorar, quer aos outros quer a nós mesmos. Isto fazemos também quando cantamos. Não te parece?
    ADEODATO - Não, de modo nenhum. Com efeito, eu não canto, a não ser muitíssimo raramente, para me rememorar, mas sim apenas para me deleitar.
    AGOSTINHO - Percebo o que pensas. Entretanto, não notas que aquilo que te deleita no canto é certa modulação do som? Ora, como esta se pode unir ou separar das palavras, uma coisa é falar, outra cantar. De facto, entoam-se cantos por meio das flautas e da cítara; as aves também cantam, e até nós, às vezes, sem palavras entoamos algum trecho musical; esta toada pode dizer-se canto, mas não locução. Tens alguma coisa a objectar?
    ADEODATO - Nada, evidentemente.

    In Opúsculos Selectos da Filosofia Medieval,
    Braga, Fac. de Filosofia, 1991, pp. 53-54

     

    QUESTÕES

    1. Explicite a objecção de Adeodato à tese de que com a locução tudo o que pretendemos é ensinar.
    2. Exponha os argumentos com que, no texto, S. Agostinho justifica a ideia de que «uma coisa é falar, outra cantar».
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

PROSLOGION, Santo Anselmo

TEXTO

    Como, porém, disse [o insipiente] no seu coração aquilo que não pôde pensar, ou como é que não pôde pensar o que disse no coração, já que pensar e dizer-no-coração são a mesma coisa? Mas se, verdadeiramente, e ainda mais porque verdadeiramente não só o pensou, já que o disse no coração, mas também não o disse no coração porque não o pôde pensar — não é de um só modo que alguma coisa se diz no coração ou se pensa. De um modo diferente se pensa uma realidade, quando se pensa a palavra que a significa, e de outro modo diferente quando se intelecciona aquilo mesmo que essa realidade é. E assim, do primeiro modo pode-se pensar que Deus não existe; do segundo modo é absolutamente impossível. Na verdade, ninguém que inteleccione aquilo que Deus é pode pensar que Deus não existe, embora diga estas palavras no coração, ou sem nenhuma ou com alguma significação inconexa. Deus, com efeito, é «aquilo maior do que o qual nada se pode pensar». Quem intelecciona isto devidamente, intelecciona sem dúvida que isso mesmo existe de tal maneira que nem em pensamento pode não existir. Quem, por conseguinte, intelecciona que Deus existe desse modo, não pode pensar que Ele não existe.

    Graças te sejam dadas, bom Senhor, graças te sejam dadas, pois o que antes acreditei por um dom teu, intelecciono-o agora por uma luz que vem de ti, de modo que, se não quisesse acreditar que tu existes, não poderia deixar de o inteleccionar.

    In Opúsculos Selectos da Filosofia Medieval,
    Braga, Fac. de Filosofia, 1991, pp. 140-141

     

    QUESTÕES

    1. Partindo do texto, esclareça o propósito da distinção entre os dois modos de pensar.
    2. Baseando-se no texto, indique a razão pela qual a inexistência de Deus é impensável.
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

O SER E A ESSÊNCIA, São Tomás de Aquino

TEXTO

    Se, porém, se considera [a natureza de] alguma realidade que seja unicamente existência, de tal modo que essa mesma existência seja subsistente, esta existência não receberá a adição de qualquer discrime, pois que já não seria unicamente existência, mas existência e além disso certa dínase [forma]. Muito menos receberá a adição de matéria, pois já não seria uma existência subsistente, mas material. De onde se conclui que tal realidade, que seja a sua existência, não pode ser senão uma só. Por conseguinte, exceptuando essa realidade, em qualquer outra a sua existência tem de ser uma coisa, e coisa diferente a sua quididade ou essência, ou dínase. Por conseguinte, nos superespíritos, além da essência tem de haver existência, e por isso se afirmou que o superespírito é essência e existência.

    Por outra parte, tudo o que faz parte de alguma realidade, ou é causado pelos princípios da sua essência, como no homem a capacidade de rir, ou advém-lhe de algum princípio extrínseco, como a luminosidade no ar a qual [advém] do influxo do Sol. Ora, não é possível que a mesma existência seja causada pela própria essência ou quididade de um ser, quero dizer, [causada] como por causa eficiente, pois, desse modo, uma coisa seria causa de si mesma e uma coisa se traria a si mesma à existência, o que é impossível. Por conseguinte, é necessário que toda a realidade desta condição, (...) cuja existência é diversa da sua essência, tenha existência recebida de outro. E, como tudo o que existe por outro reverte ao que existe por si, como à causa primeira, é necessário que exista alguma realidade que seja para todas as coisas a causa de existir, pois que ela é unicamente existência. De outro modo, ir-se-ia ao infinito nas causas, visto que toda a realidade, que não é unicamente existência, tem de ter uma causa da sua existência, como se disse. Consta, pois, que o superespírito é essência e existência, e que tem existência recebida do Primeiro Ser, que é unicamente existência. Este é a causa primeira, que é Deus.

    In Opúsculos Selectos da Filosofia Medieval,
    Braga, Fac. de Filosofia, 1991, pp. 226-227

     

    QUESTÕES

    1. Explique, a partir do texto, por que razão só um ente pode ser existência subsistente.
    2. Justifique, com base no texto, a afirmação de que a causa primeira é unicamente existência.
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

REDUÇÃO DAS CIÊNCIAS À TEOLOGIA, São Boaventura

TEXTO

    2. A primeira luz, que ilumina com respeito às figuras artificiais, que são como que exteriores ao homem e foram inventadas para obviar às necessidades do corpo, chama-se luz da arte mecânica, a qual, por ser de algum modo servil e por degenerar do conhecimento filosófico, bem pode chamar-se exterior. E esta luz se distribui pelas sete artes mecânicas, que assinala Hugo de S. Victor no Didascálico, a saber: lanifício, armadura, agricultura, caça, navegação, medicina e teatro. É aceitável a suficiência desta divisão, visto que toda a arte mecânica ou é para recreação ou para comodidade; ou é para banir a tristeza ou a indigência; ou é útil ou deleita (...).

    Se é para recreação e deleite, temos o teatro, que é a arte dos espectáculos, contendo toda a espécie de divertimentos, quer nos cânticos, quer nos instrumentos musicais, quer nas representações cénicas, quer nos movimentos rítmicos do corpo. Se a arte mecânica se dirige, porém, à comodidade ou utilidade do corpo, isto pode referir-se quer ao vestuário, quer à alimentação, quer a ambas as coisas simultaneamente. Se se refere ao vestuário, este ou é feito de matéria macia e suave, e assim temos o lanifício; ou de matéria dura e forte, e assim temos a armadura ou arte fabril, a qual compreende toda a armadura fabricada, seja de ferro ou de qualquer outro metal, seja de pedra ou de madeira.

    Mas, se a arte mecânica se aplica à alimentação, podem ocorrer dois casos, uma vez que nos alimentamos de vegetais e de animais. A que se refere aos alimentos vegetais é a agricultura; a relativa aos alimentos animais é a caça. Ou, de outra maneira: se a arte mecânica se aplica à alimentação, pode fazê-lo de dois modos: ou contribui para a produção e multiplicação dos alimentos, e então é agricultura; ou para a variada preparação dos mesmos, e assim é caça, a qual abrange todas as formas de preparar as comidas, as bebidas e os sabores, o que é da competência dos padeiros, dos cozinheiros e dos taberneiros. Contudo, esta arte mecânica recebe só a denominação de uma das suas partes, por causa duma certa excelência e preeminência.

    Se arte mecânica for, porém, de auxílio para ambas, poderá efectuá-lo duplamente: ou suprindo as suas deficiências, tal é a navegação, na qual está incluída toda a mercadoria, já respeitante ao vestuário, já à alimentação; ou removendo obstáculos e danos, o que é próprio da medicina, quer consista na confecção de xaropes, poções ou unguentos, quer na cura das feridas ou na amputação dos membros, o que incumbe à cirurgia. Quanto à arte do teatro, essa é única no seu género. E assim se põe de manifesto a suficiência da divisão das artes mecânicas.

    Coimbra, Atlântida, 1970, pp. 20-22

     

    QUESTÕES

    1. Explicite a caracterização da luz da arte mecânica apresentada no texto.
    2. Exponha, com base no texto, de que forma a arte mecânica desempenha a função de comodidade.
    3. Esclareça a importância deste extracto no contexto da respectiva obra.

 


 

 

GRUPO II

    • Seleccione apenas uma das obras que lhe são propostas e desenvolva o tema anexo.
    • Apresente um plano organizador.
    • A não identificação do tema e da obra implicará uma pontuação de O (zero) pontos.
    • A opção por um par obra-tema diferente dos que são apresentados na prova implicará uma pontuação de O (zero) pontos.
    • Na sua resposta deverá utilizar aproximadamente 80 linhas (cerca de 640 palavras).

 

    OBRAS

    TEMAS
    PRINCÍPIOS DA FILOSOFIA, R. Descartes
    O dualismo alma-corpo
    CARTA SOBRE A TOLERÂNCIA, J. Locke Estado e Igreja
    DISCURSO DE METAFÍSICA, G. W. Leibniz A natureza das substâncias individuais
    FUNDAMENTAÇÃO DA METAFÍSICA DOS COSTUMES, I. Kant Moral e autonomia
    INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DA FILOSOFIA, G. W. F. Hegel Filosofia e conhecimento racional
    TENDÊNCIAS GERAIS DA FILOSOFIA NA SEGUNDA
    METADE DO SÉCULO XIX, Antero de Quental
    A natureza do pensamento filosófico
    A ORIGEM DA TRAGÉDIA, F. Nietzsche Homem trágico e homem teórico
    DA CERTEZA, L. Wittgenstein Aprendizagem e sistemas de crenças
    ELOGIO DA FILOSOFIA, M. Merleau-Ponty Concepção de filosofia
    OS PROBLEMAS DA FILOSOFIA, B. Russell O valor da filosofia
    PROBLEMÁTICA DA SAUDADE & ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA CONSCIÊNCIA SAUDOSA, Joaquim de Carvalho Saudade e universalidade
    SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE, M. Heidegger A verdade na tradição
    TEORIA DA INTERPRETAÇÃO, P. Ricoeur A fixação do discurso na escrita

 

F I M

 

COTAÇÕES

    GRUPO I
    1. e 2.
    (2 x 25 pontos)
    50 pontos
    3.
    (1 x 70 pontos)
    70 pontos
         
     
    GRUPO II
     
     
    (1 x 80 pontos)
     
         
     
    TOTAL
    200 pontos
Viseu, Jun/2003
Arranjo gráfico de A.R.Gomes

O mocho, símbolo da filosofia
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O Canto
da Filosofia