Texto escrito no âmbito da disciplina
de Filosofia (12º ano). O autor, Márcio
Nobre, é aluno
da Escola Secundária Emídio Navarro de Viseu [12°
N, n°12] no ano lectivo de 2002/03.
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- Introdução
- Diálogo com
Locke
- Conclusão
- Bibliografia
Introdução
Com a realização deste trabalho
pretendo aprofundar a reflexão sobre a concepção
de tolerância apresentada
por John Locke na obra “Carta
Sobre a Tolerância” [1],
obra que acaba por ser precursora da Declaração
Universal dos Direitos Humanos.
A tolerância é o respeito pela
diferença desde que esta não ponha em causa a dos
outros. O meu trabalho centrar-se-á exactamente na análise
das diferenças que segundo Locke não deverão
ser abrangidas pela tolerância.
Deste modo, e para atingir o objectivo acima
apresentado, tentarei estabelecer uma espécie de diálogo
que resultará da minha reflexão partindo de extractos
da obra de Locke, com vista à aceitação ou
refutação dos limites que Locke impõe à
tolerância.
Por outro lado, tentarei aplicar a concepção
de tolerância de John Locke a situações da
época em que vivemos para assim verificar o interesse do
estudo de uma obra desta natureza.
Diálogo
com John Locke
Jovem
Caro John, é com muito espanto que
(após a leitura da Carta Sobre a Tolerância
por ti elaborada) verifico a tua elevada capacidade de previsão
dos conflitos de índole religiosa, pela definição
do direito à tolerância Religiosa. Isto é
para mim motivo de satisfação por um lado, na medida
em que consigo, através da análise da tua obra,
encontrar soluções para conflitos religiosos que
se desenvolvem na actualidade. Por outro lado, é com tristeza
que verifico que uma obra escrita no século XVII reflectindo
sobre o caminho a seguir para evitar confrontos religiosos que
se registavam nessa época, se aplica tão perfeitamente
a conflitos existentes nos nossos dias (o que significa que não
se registaram grandes progressos desde essa época).
Contudo, excluíste do direito à
tolerância determinados indivíduos. Isto significa
que não defendes uma tolerância absoluta. E eu concordo
com a limitação da tolerância uma vez que,
tal como afirma André Comte-Sponville: “Uma tal tolerância
universal seria moralmente condenável”
[Pequeno Tratado das Grandes Virtudes]. Isto
porque tolerar tudo significaria tolerar os assassinos, por exemplo.
E não podemos tolerar os assassinos, porque tolerar a diferença
destes significaria não tolerar a diferença das
vítimas destes. Tolerar o assassínio de pessoas
significa não tolerar o direito à vida destas. Penso
que isto chega para provar a necessidade de limitar a tolerância.
Contudo, se somos unânimes em admitir esta necessidade de
limitar a tolerância, o mesmo não acontece quanto
à definição dos indivíduos excluídos
do direito à tolerância.
Gostaria então que começasses
por enumerar aqueles que na tua perspectiva não devem ser
tolerados.
Locke
“…em primeiro lugar, o magistrado
não deve tolerar nenhum dogma oposto e contrário
à sociedade humana ou aos bons costumes necessários
à conservação da sociedade civil.”
Jovem
Julgo que neste ponto nos encontramos de acordo.
Na verdade, penso que quem comete actos que põem em causa
a integridade dos bens civis de alguém não deve
ser tolerado. Seja contra as nossas propriedades, o nosso dinheiro,
a nossa liberdade ou mesmo a nossa vida, qualquer atentado aos
bens civis deverá ser repreendido. Os refractários
à lei humana não deverão contudo, na minha
opinião, ser privados do seu bem mais precioso: a Vida.
Julgo que se pode e deve limitar a liberdade dos que cometem actos
contra a humanidade, para que estes não tenham possibilidade
de repetir os seus actos. No entanto, repito que não devemos
privar ninguém do direito à vida. Vários
argumentos me poderiam auxiliar para justificar esta posição,
mas referirei apenas um, que julgo suficiente para nos alertar
do perigo que a pena de morte representa. Todos estamos conscientes
de que a Justiça, por muito perfeita que possa ser, não
é infalível. Nesta medida, corremos sérios
riscos de condenar inocentes a uma pena irreversível, uma
pena para a qual não existe caminho de volta.
Uma vez definidos os limites das punições
aos refractários, cabe-me investigar melhor a natureza
desta limitação à tolerância aplicando-a
a situações actuais.
Examinemos então a intervenção
da Coligação no Iraque:
Apesar das manifestações contra
a guerra realizadas por todo o mundo, a administração
norte-americana despoletou, em coligação com Britânicos,
a Segunda Guerra do Golfo. Esta intervenção teria
como objectivos, segundo a coligação, desarmar o
Iraque, derrubar o regime de Saddam Hussein, e continuar a luta
contra o terrorismo a nível mundial. Contudo, esta Coligação
não conseguiu provar perante as Nações Unidas
a veracidade e a validade dos seus argumentos: não conseguiram
provar a existência de armas de destruição
maciça no território iraquiano; existem regimes
ditatoriais que não merecem a atenção da
Coligação, o que nos remete para outros objectivos
que ultrapassam o derrube do regime de Saddam; e não se
conseguiu provar, de forma clara, a existência de ligações
à rede terrorista Al-Qaeda. Deste modo, compreende-se que
a intervenção da Coligação não
tenha sido legitimada pelas Nações Unidas.
Apesar disto, a Coligação resolveu
empreender uma “Cruzada” para libertar os iraquianos
da opressão. É verdade que não existem guerras
justas. No entanto, esta é especialmente injusta, na
medida em que não é legitimada pela ONU, apesar
de ser despoletada por membros desta organização.
Isto significa que os interesses da Coligação foram
colocados acima dos interesses da ONU. A questão agora
é a seguinte: devemos tolerar a intervenção
militar levada a cabo pela Coligação? Penso que
a resposta é sem dúvida alguma: NÃO. Porquê?
Porque tolerar esta intervenção militar significa
não tolerar o direito à vida dos milhares de civis
iraquianos mortos pelas Coligação; porque tolerar
esta intervenção significa não tolerar o
Património Natural e Histórico do Iraque, que é
também Património da Humanidade, uma vez que esta
região foi o berço de diversas civilizações;
porque tolerar esta intervenção significa, em última
instância, não tolerar a Declaração
dos Direitos Humanos, nem as resoluções das Nações
Unidas.
Assim devemos ser prudentes na prática
da tolerância. Digo isto porque no momento em que tolerarmos
um acto devemos verificar o que é que esse acto põe
em causa, ou seja, o que é que o acto tolerado não
tolera. No caso apresentado, tolerar a intervenção
da Coligação significaria, entre outras coisas,
não tolerar a Declaração dos Direitos Humanos.
Na minha opinião, não devemos tolerar actos que
ponham em causa esta Declaração. Nesta medida, é
impossível tolerar a Intervenção da Coligação
norte-americana e britânica.
O mesmo raciocínio se aplica nos casos
de homicídio, roubo, violação, pedofilia,
fuga aos impostos, copiar durante a realização de
testes, etc., uma vez que: tolerar um acto pedófilo, um
roubo, um homicídio, uma violação, significa
não tolerar as vítimas destes actos; tolerar a fuga
aos impostos representa uma injustiça para todos os que
pagam os seus impostos; tolerar que alunos copiem durante a realização
de testes representa uma injustiça para todos os que estudam
e não copiam.
Explicada esta limitação, gostaria
que referisses o segundo limite que defines para a prática
da tolerância.
Locke
“Em segundo lugar, um mal certamente
mais escondido e mais perigoso para o Estado é constituído
por aqueles que se arrogam, para eles e para a sua seita, um privilégio
particular e contrário ao direito civil, que cobrem e disfarçam
com discursos especiosos.”
Jovem
Tal como tu, penso que nenhuma Igreja deve
ter algum tipo de regalias ou privilégio sobre as demais.
Na verdade, os conflitos religiosos têm sempre na sua origem
um certo sentimento de superioridade de uma Igreja em relação
a outra. Deste modo, não deve ser tolerado todo aquele
que se arroga, para si próprio e para a Igreja a que pertence,
algum privilégio em relação aos que não
pertencem à sua Igreja. E qual a razão que nos impede
de tolerar este tipo de pessoas? A razão é simples:
é que este tipo de pessoas não perderá a
oportunidade de impor a sua vontade e a sua religião, assim
que tiver poder para o fazer.
Em matéria de religião, não
devemos tolerar a diferença do outro quando esta põe
em causa a nossa diferença ou a dos outros, sob pena de
a tolerância pôr em causa a própria tolerância.
Percebido este limite, passemos ao seguinte…
Locke
“Em terceiro lugar, a Igreja em
que cada um passa ipso facto para o serviço e a obediência
de outro príncipe não pode ter o direito de ser
tolerada pelo magistrado”.
Jovem
Compreendo o alcance das tuas palavras…
pois se é evidente que determinas a intolerância
para com todos os que têm um soberano estrangeiro, é
evidente também que esta Intolerância se aplica aos
milhões de católicos que vivem para além
das fronteiras do minúsculo Vaticano, em que reside o soberano
religioso supremo de todos os católicos. É evidente
que procuras com esta limitação à tolerância,
evitar conflitos entre a consciência e a obrigação
das leis. E neste ponto, é interessante verificar como
tentas evitar o conflito de papéis que surge no momento
em que o indivíduo não sabe se deve obedecer às
leis da sociedade civil, ou às leis ditadas pela sua consciência.
No entanto, repara o que te poderia acontecer
se a Holanda aplicasse este tipo de Intolerância:
Imagina que emigravas para a Holanda.
Por outro lado, supõe que pertencias à Igreja
Anglicana, cujo máximo representante religioso é
simultaneamente Rei de Inglaterra. Neste caso, se os holandeses
defendessem a intolerância para com os que têm um
soberano estrangeiro, tu próprio não terias o
direito à tolerância quando te deslocaste para
este país. O mesmo raciocínio se aplicaria se
fosses católico.
Pergunto-te então: Não te julgaste
digno de ser tolerado quando te deslocaste à Holanda? Será
que verificaste algum acréscimo de conflitos por esta restrição
à tolerância não se verificar? Não
sei… talvez esta restrição à tolerância
se aplique melhor à realidade do século XVII do
que à dos nossos dias.
Para além disto, defines ainda uma
quarta limitação à tolerância…
Locke
“ Em quarto e último lugar,
os que negam a existência de uma divindade não devem
de maneira alguma tolerar-se.”
Jovem
Então defendes a intolerância
para com os ateus. Não
percebo bem em que tipo de argumento te apoias para defender tal
tese. Achas que alguém que não acredite no Juízo
Final, nem na existência de uma qualquer divindade, é
incapaz de praticar o bem, de ser justo, de ser tolerante? Não
acreditas que um ateu possa estabelecer qualquer tipo de compromisso?
Não acreditas que um ateu possa manter os seus contratos
e a sua palavra, só porque vês nele alguém
que não acredita que vai ser julgado por um ser omnipotente,
omnipresente…, e outros “omnis” que serviram,
como tu o testemunhaste, de pretexto para tanta violência,
tanta tortura e tantas mortes? Será que é o facto
de não veres nos ateus o Temor do Inferno e a Esperança
no Paraíso, que te leva a exclui-los do direito à
tolerância? Será que julgas, tal como Dostoievski,
que se Deus não existir tudo é permitido? Não
sei…, mas vou relatar-te um facto que servirá para
reflectires um pouco sobre a validade dos argumentos que utilizas
para defender a tua tese:
Numa manhã de Março,
ao passear pelos campos que rodeiam a minha casa, parei para
observar o trabalho feito em duas vinhas contíguas. Uma
era cultivada pelo próprio dono. A outra era cultivada
por trabalhadores pagos pelo senhor António. Na primeira
vinha, vi alguém que não esperava ser recompensado
ou repreendido por um senhor qualquer, vi alguém que
não trabalhava por outra razão que não
fosse tratar das videiras para que estas produzissem bom vinho…
Na segunda vinha, vi cinco trabalhadores laborando por uma recompensa
(uns pedaços de papel ou de metal); preocupando-se mais
com o salário do que em fazer um bom trabalho para melhorar
a colheita futura…
Penso que podemos tirar uma conclusão
deste episódio: não é a crença na
existência dum senhor que recompensa ou repreende o trabalho
realizado que faz do homem um bom trabalhador, mas sim a sua vontade
e capacidade de cultivar uma vinha que se possa tornar melhor
do que aquela que encontrou (seja ela sua ou dum senhor). Partindo
agora para a questão – “São os ateus
dignos de tolerância?” – e identificando os
ateus com o grupo dos trabalhadores que não têm senhor
nem esperam salário, podemos concluir que o facto de não
acreditarem em Deus, nem no Céu ou no Inferno, não
irá determinar a sua capacidade de praticar virtudes como
o bem, a justiça, a fidelidade… Na verdade, se os
ateus têm a consciência de que cultivam uma “vinha”
que é única, julgas que terão algum interesse
em fazê-lo de maneira a que esta não produza bom
“vinho”? Traduzindo: tendo os ateus a consciência
de que este mundo é o único em que podem viver,
julgas que terão algum prazer em torná-la num sítio
em que reine o mal, a injustiça, a desconfiança?…
Penso que a probabilidade de um ateu praticar o mal não
será assim superior à de qualquer outro tipo de
pessoa. Aliás, o facto de eles não olharem para
esta vida como uma mera passagem, até os torna mais sensíveis
para o valor da vida. Deste modo, julgo que os ateus são
tão ou mais dignos de tolerância quanto quaisquer
outros indivíduos. Digo “tão ou mais”
porque nunca ouvi sequer falar de perseguições religiosas
levadas a cabo por ateus, e porque nunca se conseguiu, pelo menos
de forma racional, provar a existência de Deus.
Caro John, a nossa conversa está a
chegar ao fim. Contudo, gostaria ainda de te relatar algo que
constatei e que, através duma comparação,
nos pode ajudar a compreender a crença ou descrença
de uns, e a perda de crença de outros. Não vou apresentar
qualquer solução para resolver a questão
da existência ou inexistência de Deus, mas apenas
um facto que deverá alertar-nos para a necessidade de respeitar
a posição dos ateus.
Suponho que nunca tenhas ouvido falar do
Pai Natal. É um personagem imaginário, criado pelo
Homem, e que resulta da necessidade de uma certa magia e de uma
certa felicidade momentânea. Ele até tem aparência
física: muito gordo e com barba branca. Vestido de vermelho
pela Coca-Cola. E com um trenó puxado por renas. As crianças
atribuem-lhe as capacidades de descer chaminés muito apertadas
e de oferecer presentes. Para as crianças, este sujeito
chega mesmo a existir. E tem-se um grande cuidado na manutenção
desta crença: pais vestidos de pai natal, pais natal nas
ruas, pais natal na televisão… (Não vá
alguma criança perceber que o pai natal não passa
duma criação do imaginário…)
No entanto o tempo passa, e as crianças
deixam de o ser… Tal como os adultos, também elas
acabam por alcançar uma capacidade intelectual que as impede
de acreditar no pai natal… Os pais vêem que já
não vale a pena vestirem-se à “pai natal”,
porque os filhos já compreenderam que este não existe…
já perderam a crença no pai natal.
Existem contudo algumas crianças que
nunca ouviram falar deste tal pai natal. E, por isso, este não
lhes diz nada.
Agora, e antes de partir para o estabelecimento
duma qualquer comparação, vou estabelecer três
grupos que nos serão úteis na compreensão
de determinados pontos: num primeiro grupo estarão os que
acreditam no pai natal; num segundo grupo estarão os que
deixaram de acreditar no pai natal; e num terceiro grupo estarão
aqueles que nunca acreditaram no pai natal.
Estabelecidos estes três grupos, vou
partir para a comparação do caso da crença
do pai natal com o da crença em Deus. No primeiro caso,
é dado adquirido que o pai natal não existe noutro
sítio que não seja o nosso pensamento e a nossa
imaginação; no segundo caso, verificamos que não
existem argumentos capazes de provar a existência de Deus
noutra instância que não seja a nossa fé,
ou o nosso pensamento. Por outro lado, se o primeiro é
representado por pessoas que se mascaram de Pai Natal, o segundo
é representado por pessoas que se vestem com roupas que
julgam adequadas para o papel que vão desempenhar (sacerdotes,
bispos…). Se o primeiro serve para transmitir uma certa
magia, o segundo vem “resolver” questões que
muito poderiam perturbar a vida das pessoas… Se muitos se
esforçam por manter a crença no primeiro, o mesmo
acontece com o segundo. E agora surge o problema: se as crianças
deixam de acreditar no Pai Natal, o mesmo pode acontecer com adolescentes
e adultos em relação a Deus. Na verdade, o processo
que leva a criança a deixar de acreditar no Pai Natal assemelha-se
àquele que leva um adolescente ou um adulto que sejam crentes,
a deixar de acreditar nos dogmas da sua religião e até
mesmo na existência de Deus: ao princípio acredita-se
que ele existe realmente, mas o desenvolvimento da nossa capacidade
intelectual acaba por impedir a aceitação de verdades
que não tenham um fundamento lógico e racional.
Contudo, se o processo de libertação/perda da crença
no Pai Natal é aceite com toda a naturalidade, o mesmo
não acontece quando um filho de pais crentes perde a crença
em Deus…
Por esta razão, aqueles que não
toleram os ateus devem ser elucidados, de forma a perceberem que
existem pessoas que conseguem viver felizes sem acreditar em Deus
tal como existem crianças que conseguem viver felizes sem
acreditar no Pai Natal. Só desta forma conseguiremos uma
tolerância mais abrangente e mais justa.
Poderás dizer: mas Deus é-nos
dado a conhecer pela Razão, logo é incompreensível
que alguém negue esta crença que é imanente
à condição humana; negar a crença
em Deus é negar a nossa natureza humana. Então eu
te respondo: se a crença num Deus que tudo criou fosse
imanente à condição humana, como justificas
que tenham existido na Antiguidade Greco-Romana, por exemplo,
os cultos politeístas, e não apenas cultos monoteístas?
Poderás ainda referir que em todas as civilizações
da humanidade se desenvolvem crenças em seres transcendentes.
Não posso negar este facto. No entanto, gostaria que reflectisses
sobre a hipótese de estas crenças poderem resultar
mais duma necessidade de encontrar respostas a problemas, inquietações
e perguntas para as quais o Homem não tem solução,
do que de um conhecimento que, tal como tu afirmas, se adquire
com a nossa condição humana.
É tão fácil provar a
existência de Deus quanto a sua inexistência. Assim,
cabe a cada um escolher o caminho que julga ser o mais correcto,
e aceitar o caminho que os outros julgaram ser também melhor.
Peço-te desculpa, a ti em particular
e a todos os crentes em geral, a ousadia de fazer tão grosseira
comparação entre a crença em Deus e a crença
no Pai Natal. Perdoai a minha ignorância. Foi ela que não
me deixou encontrar na vida actual melhor exemplo para compreender
a necessidade de aceitar pessoas com concepções
religiosas diferentes. O tempo que nos separa impede-me de mudar
a tua opinião sobre os ateus. Espero consegui-lo pelo menos
com os que leram estas breves palavras.
Conclusão
Espero não ter deturpado o sentido
das afirmações de Locke quando suprimi palavras
que julguei desnecessários à compreensão
de algumas ideias.
Admito não ter conseguido abranger
neste trabalho o caso dos agnósticos, e o dos ateus que
passaram a ser crentes. Volto a frisar ainda para que fique claro
que nada do que escrevi tem o intuito de negar a existência
de Deus ou de afirmar que ser ateu é o melhor caminho…
O que aqui procurei foi tentar mostrar que, em matéria
de religião, não existe qualquer argumento que justifique
a intolerância seja para com pessoas que tenham religiões
diferentes, seja para com pessoas que não tenham religião.
A tolerância não pode ser universal,
pelo que é necessário definir os seus limites. Estes
passam pela definição da própria tolerância:
respeitar a diferença do outro, desde que esta não
ponha em causa a nossa ou a dos outros.
Conclui-se assim que na prática da
tolerância só existe um limite: não tolerar
os intolerantes/a Intolerância.
Bibliografia
COMTE-SPONVILLE, André
- Pequeno Tratado das Grandes Virtudes. Lisboa: Editorial
Presença, 1995 [voltar ao texto] [desta
obra o Canto publicou um capítulo: A
tolerância]
LOCKE, John - Carta
Sobre a Tolerância. Lisboa: Edições 70,
2000 [nb: as "intervenções" de Locke no
diálogo com o Jovem são citações desta
obra]. [voltar ao texto]
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