Górgias de Platão guia de leitura - 1
|
O Górgias é uma obra acerca da retórica como uma arte, e também acerca do bom e do mau na actividade política. Górgias, cidadão de Leôncio, na Sicília, era membro da delegação que esta cidade enviou durante a guerra do Peloponeso solicitando a Atenas que se envolvesse nos negócios da Sicília. (Tucídides III.86). Agora, depois da guerra, Górgias viaja de cidade em cidade, acompanhado do seu discípulo Polo, ensinando a arte de fazer discursos. Em Atenas instalou-se na casa de Cálicles, um homem activo na política ateniense (historicamente desconhecido - provavelmente fictício). Cálicles encontrou Querefonte na rua ou na ágora, e convidou-o para sua casa para ouvir a 'demonstração' da habilidade de Górgias. |
As personagens:
Introdução dramática e posição da questão inicial: |
|
Ler 447a - 449a
'Qual é a virtude própria da sua arte', 'Que arte é essa que professa e ensina', 'Que espécie de homem [sapateiro, doutor, pintor...] é ele'? Sócrates quer o nome, e especialmente a definição, da arte que Górgias ensina, enquanto Polo pretende recomendá-lo. Ler 449b - 453a Sócrates quer a definição em termos de (i) qual é a finalidade da arte (a tecelagem serve para fabricar tecidos, a música para compor melodias), e (ii) com que matéria trabalha, nomeadamente o discurso, e (iii) sobre o que é o discurso. A definição não terá sucesso se não for suficientemente específica, i. é, se se aplica a algo mais, para além do que ela supostamente define. Assim sendo a definição de retórica não poderá aplicar-se à arte da medicina, ou da aritmética. É de notar que além de definir a retórica Górgias também concorda que ela nos confere um maior bem, nomeadamente poder político. Se e em que condições o poder político é um bem sendo o principal assunto do diálogo. |
'a retórica é a arte dos discursos e participa das artes em que o discurso ocupa posição proeminente'; 'fundamentalmente do que tem a ver com questões políticas'; 'produz uma espécie de persuasão que gera a crença, debruçando-se também sobre o justo e o injusto'; |
|
Ler 453 b - 455 c
Primeiro quis saber sobre o que era o discurso do orador. Agora Sócrates
quer saber qual a persuasão que produz, dado que existem outras
artes (tal como a aritmética) que produzem persuasão sobre
certos assuntos.
|
Nessa medida pode questionar-se: é, ou não, o orador forçosamente justo? | |
Ler 455d - 460 a
Tal como Polo, Górgias não está realmente interessado em definir a oratória, mas pretende recomendá-la como meio para atingir o poder. Ele refere que embora possa ser usada para maus propósitos não o devia ser, e Sócrates tem isto em consideração. O poder baseado na habilidade para produzir persuasões que são crenças e não conhecimento não pode ser boa coisa a não ser que seja guiado pelo conhecimento da diferença entre o bom e o mau. Górgias concorda: 'Eu penso... que também terei de ensinar isto aos alunos'. |
'se pela retórica é possível persuadir sem ter saber, como pode transmitir o saber quem previamente o não possuir?'; | |
Ler 460b - 461b
Concordas que alguém que sabe o que é justo o fará? - i. é, quem é que na realidade o tem em mente no momento da decisão, não meramente em termos abstractos mas na aplicação ao acto que estamos a considerar? Pelo conhecimento do certo e do errado, ou do bem e do mal, Sócrates provavelmente refere-se a um conhecimento das prioridades -- isto é melhor do que aquilo; e por 'bem' ou 'justo' ele provavelmente quer dizer não moralmente bom ou justo, mas bom ou justo considerando todas as coisas (Sócrates parece não fazer distinção entre o bem moral e outros bens). É possível ter em mente o pensamento considerando todas as coisas, 'todas as coisas consideradas, não fazer isto é melhor do que fazê-lo', e mesmo assim decidir fazê-lo? (Esta virtude é conhecimento -- e ninguém fazer mal por querer situa-se entre os paradoxos socráticos). O diálogo divide-se em três partes principais, nas quais Sócrates desenvolve a discussão com Górgias, Polo e Cálicles respectivamente. Polo, aluno de Górgias, desenvolve agora a argumentação (com intervenções ocasionais de Górgias). |
Nessa medida pode questionar-se:
é, ou não, o orador forçosamente justo?
A refutação e contradição de Górgias leva à intervenção de Polo e ao início do 2º acto, expresso no diálogo entre Sócrates e Polo.
|
|
[continua] | ![]()
[continua] |
Tradução e notas de
J. Costa, Viseu, Out. 1998
Arranjo gráfico e hiperligações: A.R.Gomes
|
|