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Xerazade de Rimsky-Korsakov
 
 
 
O Canto comemorou o dia dos namorados de 2000 publicando uma explicação do título de As Mil e Uma Noites. Xerazade é personagem central. 
Na ocasião aconselhei a audição da suite de Rimsky e acrescentei este guia de audição.

Xerazade, suite de Rimsky-Korsakov

(guia de audição)

1. O Mar e o barco de Sindbad. Uma introdução ajuda-nos a rememorar o tema: o sultão Shariar está habituado a matar cada uma das esposas depois da primeira noite, mas a sultana Xerazade salva a sua vida cativando-o com as histórias que lhe conta durante mil e uma noites. Após uma transição criando o clima do maravilhoso, aparece no violino solo a célebre melodia orientalizante, tema de Xerazade, tirada do poema sinfónico Thamar de Balakirev. Seguidamente a orquestra evoca o balancear do barco no mar e na tempestade.

2. O Relato do príncipe Kalender. Tema de Xerazade. De seguida o fagote executa um novo motivo daí resultante, de carácter alegre, retomado pelas outras "madeiras". Brusca mudança: ouvem-se fanfarras guerreiras (trombones seguidos de trompetes), que se repercutem a toda a orquestra. Os trémulos dos violinos e a agitação das madeiras evocam o Oiseau Roch. Regresso das fanfarras seguidas do tema inicial.

3. O Jovem Príncipe e a Princesa. Peça de um enorme encanto dominada pelos dois temas de carácter oriental. O primeiro evoca o Príncipe (Sol M); é exposto pelos violinos e depois parafraseado pelas madeiras. O segundo, mais ligeiro, ritmado pelo tamborim, evoca a Princesa. A reexposição do primeiro tema é interrompida por uma cadência do violino solo que é feita sobre o motivo de Xerazade.

4. A Festa em Bagdade, o Mar, Naufrágio do barco nos rochedos. Após uma introdução, em que o motivo de Xerazade é executado em acordes no violino solo (extremamente arriscado!), a festa retoma temas de outros andamentos, combinados num outro tema rápido em ritmo ponteado. Vários crescendos espectaculares conduzem à descrição do mar e do vento (escalas cromáticas nas madeiras), depois à do naufrágio (pancada de gongo). O andamento conclui-se com o tema de Xerazade que se esfuma no extremo agudo do violino.

Inspirada livremente em alguns episódios das Mil e Uma Noites, marcados pelo exotismo e sensualidade, Xerazade é uma verdadeira sinfonia em quatro andamentos. Os contos só são um pretexto, afirma Rimsky, um estimulante da invenção musical; não é necessário procurar, diz ele, nem leitmotiv nem correspondências precisas entre o discurso musical e as imagens evocadas pelos contos. Para afirmar ainda mais as suas intenções puramente musicais, Rimsky suprimirá os sub-títulos dos quatro andamentos, mas, nos programas de concertos, foram sempre conservados. Com efeito, as intenções descritivas do compositor não são nada duvidosas, mas ele percebeu sem dúvida que o aspecto anedótico da sua sinfonia não era o mais feliz. O valor desta partitura reside no esplendor da escrita, particularmente no brilho da orquestração e no refinamento do detalhe instrumental. Só o motivo de Xerazade no violino solo, tema cíclico que assegura a unidade de uma composição extremamente complexa, pode ser considerada como um leitmotiv. Os numerosos outros temas, segundo a sua forma e contexto, podem corresponder a ideias diferentes, sem trazer uma nova luz à nossa percepção desta obra-prima, auge da perícia de Rimsky-Korsakov, onde o orientalismo não é senão um modo de reencontrar as maravilhas das Mil e Uma Noites.
 
 

Roland de CANDÉ - As obras-primas da Música (2. De Rossini a Alban Berg). Porto : Edições Asa. 1995, p. 316-317


 
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