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O céptico do outro lado do espelho

O nº de Jan/2001 da revista magazine littéraire incluiu um dossier de 40 páginas com o título le retour des sceptiques. Dele se faz aqui uma síntese.


 
 

 

O REGRESSO DO CEPTICISMO
 


Os filósofos gostam de se reclamar da lucidez modesta de Sócrates que "sabe que nada sabe"; mas a radicalidade crítica do cepticismo (que nem sequer sabe que nada sabe) frequentemente mete-lhes muito medo. Apesar disso, de há uns anos a esta parte multiplicaram-se as investigações sobre esta filosofia. Ao mesmo tempo que se traduzem textos e estudos clássicos, de Sexto Empírico a Richard Popkin, redescobre-se a importância desta corrente de pensamento muito frequentemente caricaturada por aqueles que a pretendem refutar. Na verdade, o cepticismo não é uma escola ou uma tradição intelectual homogénea. Encarnou antes de mais em personagens e obras cuja pujança filosófica é ainda largamente desconhecida: Pirro, Arcesilau, Carnéades, Sexto Empírico, Montaigne, La Mothe Le Vayer, Bayle, Hume... sem falar de todos aqueles, mais célebres, cujo pensamento está inteiramente impregnado do cepticismo dos predecessores: Santo Agostinho, Descartes, Pascal, Berkeley, Diderot, Nietzsche, Wittgenstein... Estarão os cépticos verdadeiramente de regresso? Mas... eles nunca deixaram de estar presentes, trabalhando o pensamento e arruinando as suas pretensões, quais infatigáveis toupeiras.      

  1. (*) O cepticismo não está apenas ligado ao espírito do tempo (do nosso tempo); ele é essencial à própria filosofia -- às suas raízes: a sua dimensão metafísica. Mas encontra na moral os seus limites, na política, a sua fronteira: quem ousaria, por exemplo, não condenar Auschwitz?
  2. (*) Nestes nossos tempos de desencanto, o cepticismo pode desempenhar um papel essencial como antídoto contra o niilismo. Ele oferece uma possibilidade de melhor pensar e de melhor viver.
  3. (*) O cepticismo abre a via da dúvida criadora e da suspensão do assentimento [epoché], no intuito de atingir a felicidade. Na linha de Pirro de Élis.
  4. (*) O que fez de Pirro a figura tutelar do movimento céptico que atravessou o pensamento grego sintetiza-se na sua sentença: "as coisas são igualmente indiferentes, não avaliáveis, indecidíveis".
  5. (*) Repensando a obra de Platão, os cépticos gregos da Nova Academia praticavam a epoché como reacção contra uma doutrina estóica que queria fazer do sábio o parceiro de Deus.
  6. (*) Os cépticos engendraram diversas técnicas argumentativas, que são outros tantos medicamentos destinados a combater os estragos do dogmatismo.
  7. (*) O pensamento dos cépticos da Antiguidade ressurgiu no século XVI. Este renascimento pirrónico, ligado antes de mais à difusão dos textos antigos, foi frequentemente utilizado para fins religosos.
  8. (*) O cepticismo constitui provavelmente a única posição susceptível de conferir coerência e inteligibilidade aos Ensaios de Montaigne. O seu cepticismo visa constituir uma ética consistente, isto é, praticável. Uma ética da tolerância.
  9. (*) Na sequência do imenso sucesso dos Ensaios de Montaigne, o problema das relações entre o cepticismo filosófico e a fé religiosa (cristã) tornou-se central no início do século XVII. Uma questão de vida ou de morte: Vanini morre na fogueira em Toulouse em 1619, com a língua arrancada; Théophile De Viau morre em 1626 após alguns meses de prisão na Conciergerie.
  10. A argumentação da dúvida, em todos os textos em que Descartes desenvolve a sua metafísica, explora deliberadamente um cepticismo profundamente entranhado na cultura da época. [Ver o texto Descartes e o cepticismo, onde este tópico é desenvolvido, sendo discutidas as relações entre o pensamento cartesiano e o cepticismo (incluindo a diferença entre as dúvidas cartesiana e céptica)]
  11. (*) De Montaigne a Diderot, o cepticismo muda de natureza e torna-se um método necessário para afastar os erros e aceder à certeza.
  12. (*) Com o Tratado sobre a Natureza Humana, Hume ambiciona fundar e construir a ciência do homem através de uma abordagem radicalmente céptica.
  13. (*) A riqueza da relação que a filosofia analítica estabelece com diferentes figuras do cepticismo é a imagem da multiplicidade das correntes que atravessam hoje o domínio deste pensamento.
  14. (*) Pensar conjuntamente o quotidiano e o cepticismo (que parece acabar quando começa a actividade prática quotidiana) -- esta é a aposta de Stanley Cavell, cuja obra renova radicalmente as abordagens da filosofia analítica.

(*) Item em redacção -- para especificar ideias.


 
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