PERCEPÇÕES
e SENSAÇÕES
Charlotte BÜHLER
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A
Psicologia na vida do nosso tempo,
p. 93-94 [elementos bibliográficos aqui] |
O que é uma percepção?
O que é uma percepção
em comparação com uma sensação?
A seguinte experiência esclarecerá a diferença.
Diante da observadora
(trata-se de experiências realizadas no Instituto de Psicologia
de Viena, por O. Rubinow e L. Frankl) encontra-se uma criança
de dois meses que retribui o sorriso da senhora, com um sorriso. Agora
a observadora segura um biberão com leite a alguma distância
dos olhos de Pepi. Embora o biberão se encontre dentro do campo
visual de Pepi e ele o fixe, não dá sinal de reconhecê-lo.
Só quando a observadora agarrar em Pepi e o puser no colo do
modo habitual, ele começará a mamar, ainda antes de ela
colocar o biberão dentro do seu campo visual.
Mas dois ou três
meses mais tarde tudo é completamente diferente. Agora Pepi já
começa a mamar vivamente quando o seu olhar incide sobre a ponta
da tetina do biberão mantido a alguma distância dele. Agora
a criança reconheceu o biberão como objecto.
Ë certo que ainda
são necessários determinados sinais característicos,
como a ponta da tetina, para levar Pepi a reagir. Ele não mama
se lhe mostrarmos um balão cheio de leite. Só alguns meses
mais tarde é que ele reconhece o seu alimento também em
recipientes que sejam diferentes do biberão habitual, quer na
forma quer na cor. Ele apreende a pouco e pouco toda a situação.
Desta descrição de experiências
para a investigação das primeiras vivências de objectos
resulta uma série de factos.
O bebé de dois meses vê, ouve, saboreia
e cheira, tem sensações de tacto e de dor e de muita coisa
mais. Mas não se apercebe ainda do objecto como todo. Quando começa
a aperceber-se dele, inicialmente apenas se apercebe de determinadas características
de configuração, como o bico ou o facto de ser redondo.
Identifica o objecto através de características por vezes
de pouca importância. Só a pouco e pouco separa a apreensão
do objecto "recipiente de alimento" dos diversos dados acidentais.
Apreende o objecto no todo da situação que alude à
mamada que se segue.
Por percepção designamos, pois, um fenómeno
complexo, através do qual o mundo exterior é apreendido
e interpretado como sendo ordenado em totalidades. Estímulos presentes
assim como experiências do passado são integrados e elaborados
na visão de conjunto.
A evolução
da constância do objecto
O processo da evolução da percepção,
como é fácil de compreender, prolonga-se através
de anos, uma vez que se tem de apreender inúmeras características
e inclui-las pouco a pouco na percepção. Ilustraremos isto
com um exemplo duma fase um pouco mais tardia.
Pepi tem agora três anos e vai passear
com o pai. Passeiam por uma longa alameda composta de álamos.
"Paizinho", diz Pepi e indica com o dedo para longe, "porque
é que lá longe as árvores são tão
pequenas?" O pai compreende que o seu filho ainda não aprendeu
a ter em conta a diminuição de perspectiva à distância
e vai agora tentar explicar-lha.
Mas apesar desta explicação ainda levará
alguns anos até que a criança possa interpretar correctamente
as sensações, com todos os factores que nelas influem, isto
é, as interprete de acordo com a situação objectiva.
Coisas que mais tarde nos parecem evidentes -- por exemplo, que a luz
e a sombra, a situação e a distância não nos
impedem essencialmente de reconhecer cores e formas e de calcular tamanhos
-- tais coisas só se aprendem lentamente. Egon Brunswik e Sylvia
Klimpfinger verificaram que estes factores de constância,
como são designados, portanto a apreensão da constância
de tamanho, cor, forma, só chegam ao ponto máximo da sua
evolução entre os 10 e os 14 anos. O espaço, o tempo
e o movimento são incluídos, no decorrer da infância,
na experiência e gradualmente tidos na devida conta. A capacidade
receptiva, a memória e a inteligência desempenham aqui um
papel e também as motivações não deixam de
ter influência sobre o modo como nos apercebemos do mundo exterior.
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